sábado, 13 de abril de 2013

                                                               Perséfone

          [...] Hades, o sombrio deus da Morte, foi a Colono, perto de Atenas, onde encontrou Perséfone, filha da deusa Deméter, absorta em colher flores primaveris (...). Hades arrebatou-a em sua imensa carruagem fúnebre. Perséfone gritou mas, quando as outras moças apareceram, ela já havia sido levada sem deixar qualquer pista atrás de si (...). As moças então saíram correndo para contar tudo a Deméter. Esta, muito preocupada, disfarçou-se de velha e andou por toda a Grécia à procura de Perséfone. Viajando sem comer, nem beber por nove dias, não encontrou quem quer que lhe desse alguma informação sobre sua filha. Finalmente, a volta a Atenas, de passagem pela vizinha Eleusis, o rei e rainha trataram-na com tamanha bondade, oferecendo-lhe até o cargo de ama de seus filhos mais moços, que ela aceitou um gole de água de cevada.
          Daí a pouco o filho mais velho, Triptólemo, que cuidava das vacas reais, entrou correndo. "Se não me engano", disse ele, " a senhora é a deusa Deméter e temo está lhe trazendo más notícias. Meu irmão Eubuleu estava dando de comer aos porcos em Colono, não muito longe daqui, quando ouviu um tropel de patas e viu passar correndo uma carruagem. Nela estava um deus de rosto escuro, usando armadura preta e uma moça muito assustada que parecia ser sua filha Perséfone. Então a terra se abriu diante dos olhos de meu irmão e a carruagem precipitou-se para baixo. Perdemos todos os nossos porcos que caíram no buraco atrás dela, já que a terra logo tornou-se a se fechar".
          Achando que o rei de rosto escuro devia ser Hades. Deméter, junto com sua amiga a velha deusa feiticeira Hecate, foi interrogar o Sol, que tudo vê. O Sol recusou-se a lhe dar uma reposta, mas Hecate ameaçou fazê-lo entrar em eclipse todo dia ao meio-dia se não contasse a verdade, e ele acabou confessando: "Foi o rei Hades".
          "Meu irmão Zeus deve ter planejado isso!", disse Deméter furiosa, "Hei de me vigar dele". Em vez de voltar para o Olimpio, ela então ficou vagando pela Grécia, proibindo suas árvores de darem frutos, sua relva de crescer e seu gado de comer. Se as coisas continuassem assim por muito tempo, a humanidade sem dúvida morreria de fome. Assim, Zeus fez Hera mandar sua mensageira Íris descer pelo arco-íris com uma mensagem para Deméter: "Por favor, minha querida irmã, seja sensata e deixe as coisas crescerem de novo!" Como Deméter não dera a menor atenção ao seu pedido, Zeus mandou Poseidon, Héstia e a própria Hera entregarem-lhe presentes maravilhosos, mas Deméter, gemendo, disse: "Levem tudo embora, não farei nada por nenhum de vocês enquanto minha filha não voltar para casa, para mim!" Então Zeus mandou Hermes dizer a Hades: "A não ser que você deixe a menina voltar para casa, irmão, todos nós ficaremos arruinados." Ele também mandou por Hermes um recado para Deméter: "Você pode ter Perséfone de volta, desde que ela ainda não tenha provado o Alimentos dos Mortos." Já que Perséfone tinha se recusado a comer sequer uma casca de pão, dizendo que preferia passar fome, Hades não poderia alegar que havia seguido com ele de livre e espontânea vontade.Resolvido a obedecer a Zeus, ele chamou Perséfone e lhe disse: "Você está parecendo muito infeliz aqui, querida. Não comeu nada. Talvez seja melhor você ir para
casa." Um dos jardineiros de Hades, chamado Ascálafo, começou então a gargalhar: "Dizes que ela não comeu nada? Pois hoje de manhã eu a vi colher uma romã no seu pomar." Hades sorriu por dentro e levou Perséfone até Eleusis, onde Deméter a abraçou-a e chorou de prazer. Hades porém interveio: "Só há um problema: Perséfone comeu sete sementes vermelhas de romã - este meu jardineiro é testemunha disso. Assim ela deve voltar para o Tártaro - o mundo inferior - comigo." "Se ela for", gritou Deméter, "eu jamais levantareia minha maldição sobre a terra e deixarei que todos os homens e animais morram!" Por fim, Zeus mandou Rea (sua mãe e de Deméter) argumentar com ela. E as duas finalmente fizeram um acordo segundo o qual Perséfone tinha que casar com Hades e passar sete meses no Tártaro - um mês por cada semente de romã que comera - mas o resto do tempo ela poderia ficar na superfície da Terra. (...)

              Robert Graves, Deuses e heróis do Olímpio. Rio de Janeiro, Xenon, 1992. pp. 19-21

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