segunda-feira, 5 de julho de 2010

Patativa do Assaré

Antônio Gonçalves da Silva, filho de Pedro Gonçalves da Silva e Maria Pereiro da Silva, nasceu no sítio Serra de Santana, no município de Assaré, no sertão do Ceará, no dia 05 de março de 1909.Perdeu a vista direita no período da dentição, devido a uma doença conhecida como Dor-d'olhos.
Aos 10 anos, já compunha versos com notável domínio da métrica, apesar do pouco acesso a escolarização.
Aos 16 anos, conseguiu uma viola trocada por uma ovelha e passou a fazer improvisos, seguindo a tradição dos cantadores nordestinos.
Foi agricultor, poeta popular, compositor e cantor. Morreu em Assaré, no dia 08 de julho de 2002.
Suas obras cantadas por ele, Luís Gonzaga e Fagner: Vaca estrela e boi Fubá, A triste partida e Cante lá que eu canto cá.
Patativa do Assaré, um dos poetas mais populares, reflete bem a sua vivência e seu engajamento com um dos problemas enfrentados pelo povo nordestino - a seca.

Triste partida

Setembro passou
Com outubro e novembro
tamo em dezembro
Meu Deus, qui é de nós?
Assim fala o pobre
Do seco nordeste
Com medo da peste
Da fome feroz.

Rompeu-se o natá
Porém a barra num veio
O sol bem vermeio
Nasceu muito além
Na copa da mata
Buzina a cigarra
Ninguém vê a barra
Pois barra não tem.

Sem chuva na terra
Descamba janeiro
Depois fevereiro
E o mesmo verão
Entonce o nortista
Pensando consigo
Diz isso é castigo
Num chove mais não.

Agora pensando
Ele segue outra tria
Chamando a famia
Começa a dizer:
Eu vendo meu burro
Meu jegue e oi cavalo
Nóis vamo a São Palo
Vivê ou morrê.

Nóis vamo a São Palo
Qui a coisa tá feia
Por terras aleia
Nóis vamo vagá
Se o nosso destino
Num tão mesquinho
Pro mesmo cantinho
Nóis torna a vortá

E vende seu burro
O jumento e o cavalo
Inté mesmo o galo
Venderam também
Pois logo aparece
Feliz fazendeiro
Por pouco dinheiro
Lhe compra o que tem.

Em um caminhão
Ele joga a famia
Chegô triste dia
Já vai viajá
A seca é terrível
Que tudo devora
Lhe bota pra fora
Da terra natá.

Chegô em São Palo
Sem cobre, quebrado
E o pobre acanhado
Procura m patrão
Só vê cara estranha
De estranha gente
Tudo é diferente
Do caro torrão.

Trabaia dois ano
Trêis ano e mais ano
E sempre nos prano
De um dia vortá
Mas nunca ele pode
Só vive devendo
E assim vai sofrendo
E sofre sem pará.

Se arguma notícia
Das bandas do Norte
Tem ele por sorte
O gosto de ouvi
Lhe bate no peito
Saudade de môio
E a água nos ôio
Começa a caí.

Distante da terra
Tão seca, mas boa
Exposto a garoa
À lama e ao pau
Faz pena o nortista
Tão forte e tão bravo
Vivê como escravo
No Norte e no Sul.

(
Patativa do Assaré)

Vaca Estrela e Boi Fubá

Seu dotô me dê licença
Pra minha história contá
Hoje eu na terra estranha
E é bem triste o meu pená
Mas já fui muito feliz
Vivendo no meu lugá
Eu tinha cavalo bom
Gostava de campeá
E todo dia aboiava
Na porteira do currá.

Ê, vaca Estrela, ô, boi Fubá.

Eu sou fio do nordeste
Não nego meu naturá
Mas uma seca medonha
Me tangeu de lá pra cá
Lá eu tinha o meu gadinho
Não é bom nem imaginá
Minha linda vaca Estrela
E o meu belo boi Fubá
Quando era de tardizinha
Eu começava aboiá.

Aquela seca medonha
Fez tudo se atrapaiá
Não nasceu capim no campo
Para o gado sustentá
O sertão esturicô
Fez os açude secá
Morreu minha vaca Estrela
Se acabou meu boi Fubá
Perdi tudo quanto eu tinha
Nunca mais pude aboiá.

Hoje nas terras do Sul
Longe do torrão natá
Quando eu vejo em minha frente
Uma boiada passá
As água corre pro oios
Começo logo a chorá
Lembro minha vaca Estrela
E o meu lindo boi Fubá
Com sodade do nordeste
Dá vontade de aboiá.

Ê, vaca Estrela, ô, boi Fubá.

(Patativa do Assaré)



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